Emilia Ferreiro: a mestra que definiu a Projeto 21
  • Escola Projeto 21
  • 08/03/2023
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Emilia Ferreiro: a mestra que definiu a Projeto 21

Não seria exagero afirmar que Emilia Ferreiro revolucionou a alfabetização. No caso brasileiro em especial, a divulgação dos seus livros, particularmente o ‘Psicogênese da Língua Escrita’, cuja tradução é de 1984, causou tamanho impacto sobre a concepção que se tinha do processo de alfabetização que chegou redefinir as próprias normas do Estado para a área da alfabetização; e definiu, também, a história da Projeto 21, que nasceria no ano seguinte, em 1985.

As obras de Emilia não apresentam nenhum método pedagógico, mas um descortinar os processos de aprendizado das crianças. Isto é, ao revelar os passos percorridos por elas, os estudos da argentina colocaram em xeque os métodos tradicionais de ensino da leitura e da escrita.

Essa concepção de como as crianças aprendem não é por acaso: Emilia Ferreiro é um nome fundamental no Construtivismo – em partes porque doutorou-se na Universidade de Genebra sob orientação de Jean Piaget, aprofundando suas pesquisas para um campo que o biólogo suíço não havia explorado, a língua escrita. É possível sintetizar que tanto as descobertas de Piaget quanto as de Emilia levam à conclusão de que as crianças têm um papel ativo no aprendizado; isto é, elas constroem o próprio conhecimento – inclusive vem daí a palavra construtivismo.

Na prática, a principal consequência dessa mudança de paradigma é trocar o foco da escola do conteúdo ensinado aos sujeitos-aprendizes, o que foi totalmente revolucionário à época.

Para se ter uma ideia da mudança, muitos dos leitores adultos de hoje podem se lembrar de como aprenderam a escrever: através das famosas ‘cartilhas’. Isso porque praticamente todos os métodos de alfabetização estavam até então calcados nelas. E, ao iniciar suas pesquisas, Emilia Ferreiro passou a condenar esse uso por elas oferecerem um universo artificial e desinteressante para a criança.

Em compensação, numa proposta construtivista de ensino, a sala de aula se transformaria, criando-se o que ela chama de ambiente alfabetizador: ou seja, um espaço com muito material escrito nos murais; combinados da turma; biblioteca de sala; livros e revistas sempre disponíveis para serem lidos ou folheados, fontes de consulta permanente para todos.

Na Projeto 21, por exemplo, há uma semelhança do Projeto Político Pedagógico com essa concepção de como as crianças aprendem foi imediata – algo que vem desde o nascimento da nossa escola, ainda como Palmares.

Hoje, através da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que rege as políticas de ensino e aprendizagem no Brasil, é unânime a compreensão da função social da escrita através do uso de textos de atualidade, livros, histórias, jornais, revistas, tudo que possa trazer a língua viva e em uso. Emilia Ferreiro já defendia  isso em seus estudos iniciais e a Projeto 21 trabalha desse modo há mais de 30 anos.

Para Emilia, a introdução à cultura escrita se dá desde a Educação Infantil, por meio de textos “reais”, mesmo que as crianças nessa idade não sejam capazes ainda de ler e escrever; isso acontece primordialmente quando as professoras fazem a leitura em voz alta. Nas palavras de Emilia: “Muitas vezes, a colocamos no colo e a abraçamos, juntamente com o livro. Nesse abraço afetuoso, lhe damos acesso ao mistério. Porque a leitura em voz alta é um ato de mistério”. São estas experiências que vão permitir a introdução, de maneira natural, à cultura escrita.

E se as pesquisas de Emilia Ferreiro sustentaram muito a prática da Escola Projeto 21 desde a sua origem, isso não ficou restrito à área da alfabetização. A vertente construtivista do seu trabalho ensina que o papel do professor é o de acionar estratégias que coloquem cada indivíduo em movimento cognitivo e em busca de soluções consistentes

Exemplos disso há diariamente na Projeto 21, como mostram algumas imagens de estudantes atuando numa dinâmica de Rotação por Estações e que faz parte do que atualmente é chamado de Metodologias Ativas

Outro fruto que floresceu como resultado das práticas construtivistas, que já tinham sido endossadas a partir dos estudos sobre Emilia Ferreiro e os pressupostos que traçou, foi a instalação das Assembleias de Sala, as quais permitem que os estudantes assumam voz ativa, tragam ideias, defendam suas posições e encontrem soluções coletivamente.

As contribuições de Emilia Ferreiro são colocadas em prática no dia a dia da Projeto 21 e, certamente, o seu legado vai seguir iluminando novos caminhos para a educação; como diz outro grande pensador da educação e que também é referência para a Projeto 21, Paulo Freire: ‘a leitura de mundo precede a leitura da palavra’. Isto é, o estudante, em qualquer que seja a sua etapa de escolarização, deve, primeiramente, ler o mundo que está a sua volta, seja ele mais tecnológico ou não, entender criticamente seu contexto e fazer uma ponte entre a linguagem e a realidade.

Emilia Ferreiro faleceu no último 26 de agosto, aos 87 anos, na Cidade do México (México). A psicóloga e pedagoga argentina atuou nas universidades de Buenos Aires (Argentina), de Genebra (Suíça), e de Monterrey (México); nos últimos anos, era professora Titular do Centro de Investigação e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional, na Cidade do México.

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